sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Sala de Espera

O moço entrou no consultório. Pegou uma senha, com um número assustadoramente grande para uma sala tão vazia. Sentado ali em uma fileira de sete bancos, três dos quais estavam vagos, estava um velhinho, cochilando e babando sobre o ombro de uma moça que o acompanhava à sua direita.
Logo depois, estava um alguém que, a não ser pelas muletas, assemelhava-se perfeitamente a uma múmia. O gesso só lhe deixava um pequeno espaço para os olhos, nariz e boca. Ao seu lado, um jovem emo mascava freneticamente um chiclete.
O ventilador de teto de pás de madeira girava lentamente, como vencido pelo cansaço de anos a exercer a mesma função. Abaixo dele, no meio do recinto, uma mesinha de vidro sustentava pequenas pilhas de revistas de cinco anos atrás.
Ainda com a senha na mão, dirige-se para a secretária:
- Olá. Quanto é a consulta?
Nesse momento, um homem encapuzado entra e dispara no teto.
- Isso é um assalto! Quem é o dono dessa joça?
- Se o senhor quer ver o doutor, pois que pegue um número e espere a vez como todos os outros! – respondeu a secretária, autoritariamente.
O assaltante, envergonhado, obedece à ordem e arranja espaço ao lado do velho, recebendo de todos olhares de reprovação pela sua falta de educação.
- E a consulta, quanto é? – continuaram aqueles dois de antes.
- Trezentos reais a hora.
- O quê? Isso é um roubo!
- Ei, ei! – o meliante levantou-se alterado – eu já estou na fila! Você que o roube depois!
Uma porta então se abriu, revelando um homem de jaleco branco, acompanhado por uma idosa baixinha.
- Pela oitava vez, dona Frida, este é um consultório odontológico, não de otorrino. A senhora pode consertar seu aparelho auditivo do outro lado da rua... – diz o médico.
- Muito obrigada, doutora. Gostei muito dos seus chifres verdes.
- ... e pode consultar o oftalmologista, a duas quadras daqui.
O marginal levanta-se:
- Cansei de esperar. Pode ir passando a grana, doutô.
- Mas, e quanto a nós? – pergunta a múmia – Não vai nos roubar? O que ele tem, que não temos?
- É... realmente. Façamos o seguinte: eu roubo ele, mais três de vocês, seqüestro um e uso o outro como escudo humano.
- Parece justo. – diz o médico – Mas posso ser liberado antes das seis? Minha mulher fez almôndegas para o jantar.
- Oh sim, sim. Meus serviços são os mais rápidos da cidade. A propósito: ela usa manjericão ou páprica como tempero?
- Ao sugo, apenas.
- Nossa... mas com o preço do tomate nas alturas, deve ser um pouco difícil pra vocês, né? Eu posso voltar outro dia, se quiser.
- Seria mais apropriado. Dia 25?
- É feriado.
- Ah! Na semana seguinte, então.
- Está combinado.
E assim, todos voltaram para casa felizes porque o cronista está de bom humor hoje. Exceto a velha, que entrara em uma loja de ferragens pensando ser um banheiro público, e o médico, que já estava enjoado de almôndegas ao sugo.